VINCEN BEECKMAN, ESPINHO

A exposição integra os Encontros da Imagem 2021 e está patente em Braga, no Museu dos Biscainhos, de 17.09 a 31.10.2021.

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Confinamento. O ano de 2020 e a crise provocada pela pandemia de Covid-19 obrigou uma boa parte da população mundial a fechar-se em casa. Os dias pareceram meses e as semanas pareceram anos para os que se viram forçados ao encerramento compulsivo. Mas o que diriam aqueles que vivem em confinamento toda a sua vida? Um confinamento diferente, é certo, mas um confinamento na mesma. Este é um desafio que nos poderíamos colocar ao pensar no bairro piscatório de Espinho. Com a geométrica organização que caracteriza a cidade, as paralelas e perpendiculares ruas que fazem o bairro encontram-se cercadas por todos os lados. Como que se de uma aldeia gaulesa cercada pelos romanos se tratasse, o bairro piscatório de Espinho resiste.

Sair. Entre o campo de golfe, a linha de caminhos-de-ferro, o mar e uma abandonada fábrica de conservas, o bairro vive num permanente recordar da sua condição. Longe do luxo, frente a uma indústria que, em lugar de se reinventar, arredou pé, sem comboio para apanhar, sobra o mar. Mas também o mar, elemento constituinte e construtor da alma do bairro, parece ter abandonado aqueles que dele viviam. Um bairro de pescadores que quase não se podem fazer ao mar. Os que o fazem, têm à sua espera apenas a incerteza e a precariedade. Resta sair, em direção ao Porto ou a outros locais onde os grandes barcos se abram para estes filhos de gerações de pescadores.

Ficar. O que espera então os que ficam no bairro? O que espera os que nascem neste bairro confinado? Não apenas confinado fisicamente, mas também ao nível das oportunidades, das possibilidades, das portas que se poderiam abrir mas que, desde cedo, se fecham aos filhos do bairro? Essa é a questão com que as mulheres e homens que ficam se colocam em permanência. Olhá-los nos olhos e vê-los nas suas casas, nos cafés, sentados nas ruas que calcorrearam milhares de vezes, deitados no areal que tão bem conhecem, desvela um pouco das suas vidas e das suas razões para ficar.

Resistir. Não se pense, no entanto, que esta é uma história de resignação. Pelo contrário, esta é a história daqueles que, nascidos na adversidade, se revoltam e resistem. É a história daqueles que, perante as portas que se fecham, constroem novas vias. Não fossem estas mulheres e homens, filhas e filhos, netas e netos de pescadores que, em tempos bem mais adversos, se atreveram a navegar no mar das incógnitas. E, quem sabe, talvez deste confinamento forçado saia uma nova resistência.

Jorge Pinto

Maio de 2020

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Vincen Beeckman, Espinho

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A exposição de Vincen Beeckman, “Espinho”, integra os Encontros da Imagem 2021 e está patente em Braga, no Museu dos Biscainhos, na R. dos Biscainhos, de 17 de setembro a 31 de outubro de 2021.

A apresentação do livro homónimo teve lugar no dia 18 de setembro no local da exposição.

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Vincen Beeckman (1973), residente em Bruxelas, alimenta-se dos universos que percorre e que o movem na sua prática. Colaborando intensa e tão frequentemente quanto possível com os personagens que preenchem as suas imagens, permite-se também ele ser modelo, ou formar uma dupla narrativa com eles. Imerso na sua atividade, dentro de grupos, muitas vezes posiciona-se como fio condutor de um acervo fotográfico em construção. No projeto Cracks, por exemplo, Vincen Beeckman usou câmaras descartáveis em colaboração com os sem-abrigo da Estação Central de Bruxelas.

O seu trabalho foca a fragilidade da vida humana e a energia positiva que pode ser descodificada ou injetada nela. Como criador de projetos inusitados como La Fusée de la Motographie ou La Pêche aux Canards Belge (Arles, 2019), também sabe como se distanciar de uma imagem e reunir histórias míticas ou realistas por meio de outros meios, como som, texto , fazer geléia, ou ainda, danças do chá …

Outro talento notável: Vincen é um fã de minigolfe!

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Sobre esta edição dos Encontros da Imagem, escreve a Direção:

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Génesis 2:1, foi o tema escolhido para a 31ª edição dos Encontros da Imagem – Festival Internacional de Fotografia e Artes Visuais.2021, que este ano decorre entre 17 de setembro e 31 de outubro. Entre as muitas outras atividades, o Festival engloba 47 exposições distribuídas por 25 espaços distintos, envolvendo a participação de 64 fotógrafos.

“Génesis 2:1” dá continuidade ao tema do ano passado e, nunca um tema escolhido, se enquadrou tão bem no contexto da atualidade.

Um ano depois, voltamos também nós e todo o mundo – em resultado da crise pandémica provocada pelo Covid-19, de novo, a ter que passar por um confinamento generalizado.

Gerou-se a confusão e o caos. Uma incapacidade coletiva para compreender a desordem das coisas, confrontando a humanidade com desafios cada vez mais complexos e exigentes.

A sociedade contemporânea está desde há muito, perante enormes desafios de carácter global: desde as questões relacionadas com o planeta e os seus problemas ecológicos – perda da biodiversidade, alterações climáticas, aquecimento e contaminação – até às civilizações que o habitam, onde muitas delas geram novas desigualdades e indiferença moral – regimes políticos, religiosos, fronteiras, refugiados, racismo, questões de género e muitas outras.

Aquilo a que chamamos progresso, não só deixou de coincidir com a humanização do mundo, como pode acabar por ditar o seu fim. Urge encontrar soluções para acabar com as desigualdades e indiferença em relação ao sofrimento de milhões de pessoas.

Uma interrogação se pode colocar: que futuro nos espera?  A crise em que vivemos constitui uma oportunidade para que todos encontremos causas comuns e discutamos as melhores soluções para o que deva ser feito.

Assim, e também com o objetivo de alerta, muitas das exposições agora apresentadas no âmbito dos Encontros da Imagem, para além do seu lado estético, abordam algumas das questões pertinentes que o mundo contemporâneo hoje vive.

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Pode ver no FF a Agenda dos Encontros da Imagem e sobre outras exposições dos Encontros, aqui.

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Cortesia: Encontros da Imagem.

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